NÃO HÁ COVID QUE TRAVE OS JOGOS DE GUERRA DA NATO

A NATO está a desconfinar os jogos de guerra na Europa que, em boa verdade, nunca chegou a confinar. Manobras militares vão decorrer durante duas semanas na Polónia – uma imensa base militar norte-americana – no âmbito dos envolventes e abrangentes exercícios Defender-Europe 20. Milhares de soldados dos Estados Unidos, o país mais atingido pela epidemia, desembarcam na Europa, continente onde se viveu uma carnificina, para queimar milhões de dólares e euros que seriam essenciais para os sistemas de saúde pública e uma genuína recuperação da economia.

Manlio Dinucci, Il Manifesto/O Lado Oculto

Os Estados Unidos e a NATO acabam de retomar os jogos de guerra em solo europeu que foram suspensos devido à pandemia de COVID-19. Nenhum dos objectivos iniciais foi suprimido. Trata-se, como sempre, de afinar a política externa da União Europeia pelas actividades do US Army Europe (Exército de Terra dos Estados Unidos na Europa) “depois de atenta avaliação e planificação”. Nesse sentido, decorrerão na Polónia, de 5 a 19 de Junho, as manobras Allied Spirit (Espírito Aliado) no quadro dos grandes exercícios Defender Europe 20 (Defensor da Europa 2020).

Nas manobras em solo polaco participarão quatro mil soldados norte-americanos de unidades de blindados e de infantaria, em conjunto com dois mil soldados polacos. Esta fase dos jogos de guerra deveria ter decorrido em Maio mas foi adiada porque o Defender Europe 20 foi parcialmente modificado na sequência do COVID-19. No entanto, explica o US Army Europe, quando em Março foi suspenso o envio de forças a partir dos Estados Unidos “mais de 90% dos equipamentos destinados ao Defender Europe 20 deslocavam-se já para a Europa a bordo de aviões e navios”. Ao todo, chegaram mais de três mil peças de equipamento, a começar pelos tanques de assalto, aos quais se juntaram mais de nove mil veículos blindados e outros veículos oriundos de depósitos “pré-posicionados” que o Exército de Terra norte-americano tem na Alemanha.

Dos Estados Unidos chegaram mais de seis mil soldados, para se juntar a outros milhares baseados na Europa. Apesar “do ajustamento devido ao COVID-19”, comunica o US Army, “concretizaram-se numerosos objectivos de rapidez estratégica”. Anuncia ainda que para recuperar o tempo perdido “o US Army Europe está em vias de planificar exercícios suplementares nos próximos meses, baseados em numerosos objectivos originais do Defender Europe 20 visando aumentar a rapidez e a interoperabilidade das forças norte-americanas e aliadas”.

Polónia, uma base militar norte-americana

O Allied Spirit é, portanto, o primeiro de uma série de exercícios no mesmo quadro estratégico claramente contra a Rússia. Não é por acaso eu se realiza na Polónia. É aí – segundo o que foi estabelecido na declaração assinada pelo presidente Trump com o presidente polaco Duda em Setembro último – que os Estados Unidos estão a aumentar fortemente a sua presença militar. O número de soldados mantidos em permanência no país, com um sistema de rotação, aumentou de 4500 para 5500.

Em Poznan, o Exército de Terra dos Estados Unidos instalou o seu próprio quartel-general de divisão numa base avançada. Em Drawsko-Pomorskie, as forças armadas norte-americanas estão a abrir um centro de treino de combate. Em Wroclaw-Strachwice a Força Aérea dos Estados Unidos instalou uma grande escala aeroportuária de desembarque. Em Lask, a Força Aérea norte-americana colocou um esquadrão de aviões sem piloto, incluindo drones Reaper. Em Powidz está instalada uma brigada aérea de combate.

Em Powidz, como em Lubliniec, as forças norte-americanas de operações especiais criaram as suas próprias bases. Numa localidade ainda por definir será instalada em permanência a esquadra de combate de uma brigada blindada dos Estados Unidos. Todo o equipamento está armazenado já em Bergen-Hohne, na Alemanha.

O Exército de Terra dos Estados Unidos na Europa informa, por outro lado, que a 173ª Brigada aerotransportada, baseada em Vicenza, Itália, está a planear operações nos Balcãs e na região do Mar Negro, enquanto o 10º Comando de defesa aérea e de mísseis participará em manobras no Báltico.

A Força Aérea dos Estados Unidos informa que três tipos de bombardeiros estratégicos norte-americanos com dupla capacidade convencional e nuclear – B-2 Spirit, B-1B Lancer e B-52H – realizaram missões na Europa em Maio, partindo dos Estados Unidos. Ficou assim demonstrado que “a pandemia de COVID-19 não comprometeu a rapidez e o alcance dos bombardeiros estratégicos dos Estados Unidos”.

Estes factos, ignorados pela grande comunicação social que em Março se apressou a “apagar” o Defender-Europe 20 por causa do COVID-19, confirmam que os Estados Unidos não anularam a operação estratégica, apenas a remodelaram prolongando-a. O objectivo de Washington continua a ser o de aumentar a tensão com a Rússia utilizando a Europa como primeira linha do confronto. Isto permite aos Estados Unidos reforçarem a sua liderança sobre os aliados europeus e orientar a política externa e militar da União Europeia, na qual 22 dos 27 Estados membros pertencem à NATO, sob comando norte-americano.