PENTÁGONO COM ORÇAMENTO MONSTRUOSO
2018-08-15
José Goulão; com Martha Ladesic, Washington
O orçamento para 2019 do Departamento da Defesa dos Estados Unidos, vulgo Pentágono, atinge o valor monstruoso de 716 mil milhões de dólares, o triplo dos gastos conjuntos da Rússia e da China e sem incluir os investimentos que venham a ser feitos na rubrica de guerra espacial.
Estabelecido sem discordâncias de maior entre os republicanos e os democratas do Congresso, o orçamento militar norte-americano para o próximo ano tem uma designação específica, em homenagem a um padrinho: o senador falcão John S. McCain, um dos maiores responsáveis pela integração dos grupos mercenários terroristas islâmicos, designadamente Daesh e al-Qaida, nos aparelhos militares que conduzem as guerras de agressão dos Estados Unidos e da NATO, sobretudo no chamado Médio Oriente alargado.
John S. McCain National Defense Act for Fiscal Year 2019 é a designação oficial que democratas e republicanos aprovaram para a lei do orçamento do Pentágono, confirmando que dentro do chamado “Estado profundo” norte-americano existe um conflito estratégico aberto entre a Casa Branca e influentes sectores da Defesa e Segurança – um confronto que esbate as fronteiras partidárias e coloca os principais dirigentes democratas do lado das tendências mais belicistas, associadas ao terrorismo.
O valor de 716 mil milhões de dólares para o ano de 2019 traduz um acréscimo de 82 mil milhões de dólares, ou 11,5%, em relação a 2018. Só a parcela de aumento anual representa mais 34,5% do que o total do orçamento militar russo deste ano – 61 mil milhões de dólares – e cerca de metade do orçamento militar da China – 175 mil milhões de dólares. O orçamento do Pentágono é nove vezes maior que o da Rússia e triplica o chinês.
Prevê-se que a tendência para o agravamento do esforço de guerra norte-americano seja constante, uma vez que está previsto outro aumento de 82 mil milhões de dólares em 2020, elevando o valor global para as imediações dos 800 mil milhões de dólares nesse ano.
Enormes gastos e muita acrimónia
Os maiores investimentos orçamentais estão previstos na guerra aérea, através da aquisição dos novos caças F-35; na guerra nuclear, com a aposta em bombas “miniatura”; e na chamada “guerra cibernética”.
As rubricas explicitadas não incluem a guerra espacial, uma opção recentemente considerada necessária pelo conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton, dando força às contradições que se vêm agravando na estratégia Trump: ora afirmando intenções pacificadoras nas mediáticas cimeiras que promove, ora acompanhando as pressões belicistas do “Estado profundo”, reflectindo o poder da indústria armamentista.
“O aumento orçamental de 82 mil milhões de dólares levar-nos-á a uma posição de primazia”, comentou o secretário da Defesa, James Mattis, dando voz ao mau estar que se vem sentindo no Pentágono perante a eficácia dos sistemas militares russos de última geração, entre os quais avultam as capacidades para “cegar” as comunicações da NATO - deixando as superequipadas forças da aliança expostas e vulneráveis a ataques com muito mais reduzido poder de fogo.
Daí que nem sempre os desníveis orçamentais correspondam a uma garantia de êxito, principalmente quando a situação revela uma autêntica guerra civil entre os poderes norte-americanos, extensiva ao globalismo capitalista em geral.
Por exemplo, Donald Trump evitou citar o nome de John McCain, abreviando para isso a designação oficial da lei do orçamento durante o acto da sua promulgação.
John McCain, gravemente doente, e Donald Trump têm-se enfrentado a propósito de medidas assumidas pela Casa Branca tendentes a reduzir o envolvimento norte-americano directo nas guerras do Médio Oriente e no apoio ao terrorismo, principalmente na Síria. Esta actuação deixou Trump na mira não apenas dos democratas, que apostaram nessas guerras prosseguindo a estratégia de George W. Bush, mas também de sectores dominantes entre os republicanos.
O orçamento monstruoso do Pentágono para os dois próximos anos e a designação oficial da lei para 2019 são encarados como uma provocação à Casa Branca lançada pela corrente do establishment que tem controlado o poder imperial nas últimas décadas. Apenas oito senadores democratas e os republicanos Rand Paul e Mike Lee votaram contra a “lei orçamental John S. McCain”, o que parece evidenciar um isolamento da Casa Branca perante o instinto declaradamente belicista do Congresso – tendência em que as esmagadoras maiorias dos democratas e dos republicanos se fundem numa espécie de partido único.
Porém, é convicção geral de que a guerra interna ainda apenas começou. As eleições de Novembro renovarão um terço do Congresso. Também em Novembro está prevista a divulgação dos resultados da primeira auditoria de sempre efectuada ao Pentágono – a maior operação do género na história.
Apesar de, no início dos anos noventa, ter sido determinado que todos os departamentos e agências se submeteriam a auditorias, o Pentágono vem-se mantendo ao abrigo dessa decisão.
Em princípio, seria de prever que esta investigação revelasse o “poço sem fundo” que são as contas militares norte-americanas, onde se jogam interesses com dimensões incalculáveis.
No quadro actual de choque de poderes torna-se também previsível que os resultados da auditoria, as suas eventuais demonstrações de alta corrupção, de enormes negócios pouco lícitos e ainda menos “patrióticos” funcionem como armas de arremesso cruzadas entre os sectores desavindos.
Pode acontecer que muitos desses resultados sejam escondidos da opinião pública, tal a sua gravidade e poder desestabilizador; porém, não deixarão de alimentar os confrontos nos ambientes em que se tornam, muitas vezes, determinantes – os bastidores.