O OCIDENTE DEIXOU DE SER UM MODELO PARA O MUNDO

2020-05-24
Jorge Fonseca de Almeida*, Especial O Lado Oculto
A actual pandemia mostrou claramente que o Ocidente capitalista, quer na sua versão mais desumana e selvagem norte-americana quer na sua versão europeia anquilosada, não serve como modelo de sociedade a seguir.
Com a queda da URSS e a relativa fraqueza chinesa à época, o Ocidente capitalista tornou-se o único modelo de sociedade para a maioria do globo e mesmo para os intelectuais de uma certa esquerda europeia. Francis Fukuyama pôde escrever um livro intitulado “O fim da História e o último homem” em que defendeu que não há alternativa à sociedade liberal de tipo norte-americano. Foi ouvido e a Europa começou imediatamente a desmantelar as suas instituições sociais e a enveredar por um neoliberalismo destruidor de serviços públicos e da coesão social.
Nos últimos 30 anos os Estados Unidos assumiram-se como a única superpotência, invadindo, matando, promovendo golpes de Estado, como o da Ucrânia, destruindo todos os que se lhe opunham. Simultaneamente a China e outros países asiáticos como o Vietname foram crescendo de forma pacífica e mostrando que há outros caminhos para a prosperidade.
A crise do COVID-19 mostrou, pela primeira vez, uma outra realidade que se já adivinhava: a da falência do modelo de capitalismo norte-americano.
Incapazes de competir nos termos que os próprios estabeleceram nos mercados internacionais, os Estados Unidos desencadearam uma guerra económica contra os outros blocos económicos (China, Europa) através de restrições e tarifas aduaneiras, procurando dessa forma evitar que as suas empresas enfrentem a concorrência estrangeira. O regresso a um nacionalismo económico puro e duro. Mais do que um sinal de uma vontade firme, o que tais medidas denunciavam era uma fraqueza endémica. O caso da Huawei mostrava que os EUA não estavam apenas a perder a competição económica mas também a competição na área da ciência e da tecnologia.
Reacção desastrosa à pandemia
Com o desencadear da pandemia a resposta ocidental foi desastrosa, como atestam os números. Enquanto os países asiáticos controlaram em estreitos limites a doença, no Ocidente as medidas tomadas forma as mais erráticas, tardias e incompetentes, redundando em centenas de milhares de mortes evitáveis.
Desespero dos trabalhadores da saúde em Itália
Os Estados Unidos não conseguiram liderar a luta contra a pandemia, pelo contrário tentaram sabotá-la o mais possível para que o seu desastre interno fosse replicado noutros países. Na Europa as respostas que privilegiaram a inacção (só depois de espalhada a doença é que os países se autoisolaram, só depois de propagada a doença se lançou a quarentena) contrastam com o dinamismo asiático que, por antecipação, fechou Hubei impedindo a disseminação, universalizou o uso de máscaras, aconselhou a quarentena voluntária.
Mas não foi só na China Continental que esse modelo foi seguido. Pelo contrário, depois de um momento de hesitação a Coreia do Sul, o Japão, Singapura, o Vietname, a Tailândia seguiram, em linhas gerais, o modelo chinês. O êxito é evidente. O resto do mundo está a ver.
Desesperados, círculos ocidentais agora vêm gritar que a China não informou, que está a mentir sobre o número de mortos. Mas como sustentar essa tese se os países que seguiram o modelo chinês tiveram os mesmos resultados, mesmo aliados tradicionais norte-americanos como o Japão?
Um pequeno quadro de resultados é bem elucidativo das diferenças de resultados das diferentes respostas à pandemia – na Europa, até 23 de Maio, o número de mortes por milhão de habitantes situa-se nos 280, nos Estados Unidos em 298 e na China 3, no Japão 5, na Coreia do Sul 5, em Taiwan 0,5, em Singapura 4, na Tailândia 0,8, no Vietnam 3, no Japão 6. Não há comparação, Quantas centenas de mortes evitáveis, quanto sofrimento escusado.
E no Ocidente as elites económicas e aquelas que com elas interagem entraram em quarentena, mas outros tiveram de continuar a trabalhar. Por isso as mortes acumulam-se nas classes trabalhadoras e nas minorias étnicas.
Fica claro para o mundo quem sabe proteger o seu povo de uma pavorosa infecção e quem o deixa morrer para provocar um mítico “efeito de manada”.
A crise que se instalou no Ocidente, e que vai significar uma enorme redução do nível de vida dos europeus e norte-americanos, será mais uma prova de que o modelo ocidental está genericamente exaurido e que a resposta a este esgotamento é, no plano interno, o fechamento económico, o controlo social, o autoritarismo e a retirada de direitos sociais; e, no plano externo, o militarismo e a escalada de tensões político-militares com os países asiáticos.
*Economista, MBA