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ALMAGRO, O RETRATO DE UM CAPATAZ COLONIAL

2019-12-30

ALMAGRO, O RETRATO DE UM CAPATAZ COLONIAL

Luis Almagro não pára. Em funções de secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), isto é, de capataz do poder colonial norte-americano no “quintal das traseiras”, desdobra-se em agrados à administração Trump para conseguir ser reeleito em 2020. Agora tomou como empreitada uma campanha contra a acção dos médicos e serviços de saúde cubanos para salvar vidas em 78 países do mundo. É o seu mais recente ponto de agenda depois de ter montado o golpe fascista na Bolívia enquanto continua a conspirar contra a Venezuela; mas sem se lhe ouvir um reparo perante os comportamentos fascistas dos governos do Chile, Colômbia, Peru, Brasil, Equador. Falhou a conspiração em Dominica, agora uma nódoa no currículo a apresentar a Mike Pompeo, o seu chefe directo no Departamento de Estado norte-americano.

Tony López R.*, America Latina en Movimiento/O Lado Oculto

O farisaico secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o uruguaio Luis Almagro, pretende montar um espectáculo na sede da organização com o objectivo de iniciar uma campanha de descrédito contra a Colaboração Médica Cubana, seguindo fielmente as ordens do Departamento de Estado norte-americano e do seu chefe Mike Pompeo. A falta de vergonha de Almagro para ver se no próximo ano consegue ser reeleito no cargo não tem limites.

Atacar o nobre e humanitário trabalho de Cuba ao prestar serviços de saúde com o objectivo de salvar vidas, curar doentes e precaver doenças é uma coisa que jamais aconteceu na história da América Latina e na de outras 78 nações onde os médicos cubanos cumprem e cumpriram essa missão humanitária; uma missão desempenhada inclusivamente com risco das próprias vidas, como se verificou em África quando prestaram serviços para combater a doença mortal conhecida como Ébola.

Um trabalho caracterizado por proporcionar serviços de saúde aos sectores populares mais vulneráveis e em longínquos territórios onde os médicos nacionais se negam a dar assistência, como por exemplo no caso do Brasil; país onde a brigada destacada já regressou a Cuba por decisão política do presidente Jair Bolsonaro, para agradar a Donald Trump, deixando sem cobertura médica cerca de dois milhões de brasileiros que eram seguidos pelos profissionais cubanos de saúde.

Mercenário com ampla folha de serviços

Almagro, porém, tem uma longa lista de serviços mercenários prestados a favor da política imperial do governo de Donald Trump. As pressões sobre os governos latino-americanos e das Caraíbas são abundantemente conhecidas: grandes foram as suas manobras dentro da OEA para punir a Venezuela e aplicar-lhe a neocolonial “Carta Democrática”, que tem muito de colonial e pouco de democrática.

Todas as suas manobras contra a Venezuela, em violação da Carta da OEA, fracassaram e cobriram-no de absoluto ridículo. Apesar das derrotas Almagro insiste e, juntamente com o governo da Colômbia, presidido por Iván Duque, e outros como o chileno, o brasileiro, o peruano e o equatoriano continua subrepticiamente a encorajar uma intervenção militar na Venezuela.

De nada lhe serviu criar o tristemente conhecido Grupo de Lima, cuja composição já não passa de oito membros, por sinal os mais activos na suposta defesa “dos direitos humanos e da democracia”. Entre eles encontram-se o Chile, a Colômbia, o Equador, o Peru e o Brasil, que paradoxalmente são hoje os mais fiéis expoentes das mais graves violações dos direitos humanos, civis e democráticos.

No Chile “no pasa nada”

No Chile, o senador Alejandro Navarro apresentou uma grave acusação contra o presidente Sebastián Piñera, segundo a qual este terá cometido crimes contra a humanidade. Sabe-se que nos dois meses de fortes e grandiosas manifestações, greves, protestos e reivindicações contra o modelo neoliberal e por uma nova Constituição Nacional a repressão provocou pelo menos 32 mortos, 2500 feridos, nove mil detidos e mais de 300 pessoas com perda de visão devido aos disparos dos Carabineiros directamente contra os rostos dos manifestantes. Além disso, o Movimento Saúde em Resistência acusou as forças repressivas de lançarem água adicionada com componentes de gás pimenta e soda cáustica sobre os manifestantes.

Assim é o tão elogiado sistema democrático chileno, em relação ao qual Almagro não pronunciou sequer um reparo condenando tão feroz e brutal repressão.

Na Colômbia também…

O que está a acontecer na Colômbia também não fica atrás, onde as manifestações, as greves e os protestos de milhões de cidadãos exigem a mudança do modelo económico de livre comércio, o cumprimento dos Acordos de Paz e o desmantelamento da organização repressiva ESMAD e dos grupos paramilitares, além da retirada dos projectos de lei sobre as reformas laborais e fiscais. Nos seis encontros entre a Comissão de Greve e o governo não foi possível chegar a acordo em qualquer destes pontos; pelo contrário, o executivo mantém as posições inalteradas, além de a Câmara dos Representantes e o Senado terem aprovado a reforma fiscal – desafiando frontalmente os protestos populares e ignorando a Comissão de Greve.

Na Colômbia continuam os assassínios de dirigentes sociais, que se elevam a mais de 800. Também 170 desmobilizados da guerrilha já pagaram com a vida. Tal como no Chile, o povo é reprimido criminosamente pelas unidades policiais da ESMAD. O caso do jovem Dilan Cruz ficou como o mais emblemático entre os crimes cometidos por esse corpo policial, devido à forma criminosa, brutal e sem piedade como foi abatido por um agente do ESMAD.

Com Guaidó nos braços

O secretário-geral da OEA não se pronunciou sobre este crime, as graves violações dos direitos humanos, as detenções arbitrárias, as torturas e violações também na Colômbia. Longe disso: de acordo com denúncias feitas pelo governo da Venezuela, Luis Almagro integra uma conspiração juntamente com o presidente Iván Duque e o senador e ex-presidente colombiano Alvaro Uribe, apoiados pelo autoproclamado Juan Guaidó e Leopoldo López, para desenvolver um plano de acções terroristas. O facto foi confessado por alguns membros dos bandos terroristas venezuelanos e paramilitares colombianos detidos nos últimos dias.

Na sequência destes factos, a Procuradoria-Geral da República Bolivariana da Venezuela, a pedido do presidente Nicolás Maduro, ordenou a detenção de Juan Guaidó. Leopoldo López está sob a protecção da Embaixada de Espanha e, em relação a isto, há que esperar a decisão do governo espanhol: se assume a protecção de um terrorista ou se decide entregá-lo à justiça venezuelana.

Peru e Equador

Peru e Equador, igualmente membros do Grupo de Lima, também enfrentam sérios protestos das populações na sequência de violações dos mais elementares princípios da democracia. No Peru, a impunidade está presente na libertação de Keiko Fujimori e na corrupção que grassa nos aparelhos legislativo e judicial, que desafiam o presidente Vizcarra. Este, porém, segue como um cordeiro fiel as directrizes do Departamento de Estado norte-americano.

No Equador, o “pacotão” imposto pelo governo de Lenin Moreno, cumprindo as ordens do FMI, está num autêntico labirinto sem saída clara. Os crimes cometidos por agentes do Estado contra nove manifestantes de origem indígena continuam impunes e o acordo do presidente com a CONAIE (a Confederação das Nacionalidades Indígenas) em Guayaquil foi desrespeitado e falseado pelo próprio Lenin Moreno. Continua a perseguição contra dirigentes e militantes da Revolução Cidadã, violando os direitos cívicos e democráticos dos equatorianos que militam nas fileiras do ex-presidente Rafael Correa. Luís Almagro também não denunciou nem condenou estas realidades.

Golpista na Bolívia

A grande responsabilidade do secretário-geral da OEA no golpe de Estado na Bolívia contra Evo Morales deve ser denunciada e julgada pelos povos e governos da América Latina e das Caraíbas.

Foi a delegação da OEA que participou como observadora nas eleições bolivianas, guiada por Luis Almagro, que declarou, sem qualquer base, que existiram irregularidades na votação. Esse facto que fez com que o presidente Evo Morales, acreditando erradamente que Luis Almagro e os funcionários da OEA actuariam com honradez, aceitasse uma auditoria; esta continuou a assinalar irregularidades, o que acendeu o rastilho e abriu o cenário no qual o general traidor ao seu povo William Kaliman e os membros do Comando Militar “sugeriram” a Evo Morales que renunciasse. Era evidente que se não renunciasse seria deposto pela força; enquanto isso acontecia, a residência da irmã do presidente foi assalta e esta feita refém.

Tudo isto fazia parte de um plano que foi posto em andamento dois meses antes das eleições, orientado pelos Estados Unidos através do seu encarregado de negócios na Embaixada em La Paz. Os conspiradores reuniam-se com ele na província argentina de Jujuy, que faz fronteira com a Bolívia, sob protecção do governador e homem de confiança do então presidente Mauricio Macri.

Com sentido humanista e orientado pela preocupação de evitar o derramamento de sangue do seu povo, Evo Morales decidiu renunciar e abandonar o país para o México, estando actualmente exilado na Argentina.

Paradoxalmente, o governo de facto ilegal actuando em La Paz fez agora à Interpol um pedido de extradição de Evo Morales, acusando-o de sedição e outros delitos. Um comportamento insólito por parte de um governo usurpador e violador da Constituição Nacional boliviana, nascido de um golpe de Estado. Sob as ordens da autoproclamada presidente Jeanine Añez têm vindo a cometer-se crimes repugnantes contra o povo indígena, humilhando-o ao pisar a sua bandeira, seu símbolo mais representativo.

Ignora-se como a OEA e Almagro sairão do grande escândalo que já é público e segundo o qual Evo Morales ganhou com toda a clareza as eleições de 20 de Outubro. O reconhecimento deste facto aconteceu logo que foi dado o golpe de Estado e o poder entregue a uma organização de extrema-direita com apoio das forças militares e dos Estados Unidos.

Na Bolívia continua em funções uma organização inimiga da pluralidade e dos povos originários, com acções criminosas e terroristas, oriunda de Santa Cruz de La Sierra; é encabeçada pelo rico empresário e fundamentalista cristão Luis Fernando Camacho, cuja família é proprietária de grandes extensões de terras das quais se extrai lítio.

O capítulo da Bolívia não está encerrado. Os supremacistas brancos que detêm o poder já puseram as garras de fora e começaram a desmontar todo o trabalho social e popular que, ao longo de 13 anos de Governo, Evo Morales e o seu partido MAS (Movimento para o Socialismo) foram construindo. As ofertas de investimentos estrangeiros, especialmente norte-americanos, já estão em La Paz, o FMI volta a marcar presença e a intenção é a de privatizar as empresas estatais.

Almagro vai ter de responder pelos crimes cometidos, que somam mais de 40 mortos, centenas de feridos e detidos e que aconteceram a partir da saída de Evo Morales e do seu vice-presidente Álvaro García Linera.

Dominica

Na sua acção como operacional político de Mike Pompeo, Luis Almagro montou em Dominica o mesmo estratagema que na Bolívia, uma campanha de descrédito do primeiro-ministro para apoiar o seu rival eleitoral, aliado dos Estados Unidos nesta ilha das Caraíbas. Nesta situação, porém, o primeiro-ministro Roosevelt Skerrit não foi na cantiga do secretário-geral para que a OEA supervisionasse as eleições e Almagro saiu derrotado.

Como derrotado será pelos protestos e condenações que seguramente os povos da América Latina e das Caraíbas e de outros continentes não deixarão de fazer contra o farisaico Luis Almagro pela sua campanha contra as Missões de Médicos e Profissionais de Saúde Cubanos. Almagro qualifica a sua acção como “trabalho escravo” para beneficiar economicamente, segundo ele, o governo cubano. Mas quem lhe respondeu muito bem foi um médico cubano entrevistado pela comunicação social: “Saiba, senhor Almagro, que apenas somos escravos do nosso trabalho salvando vidas, que hoje são mais de seis milhões em cerca de 78 países, fazendo-o graças aos convénios e à colaboração solidária do nosso governo e do nosso povo”. 

Em Cuba, senhor Almagro, a medicina não é uma mercadoria, não repita como um papagaio o que lhe dita o governo de Donald Trump. As suas aspirações à reeleição não estão na agenda de governos honestos e verdadeiramente democráticos e que não fazem parte do minoritário e corrupto Grupo de Lima. Deixo-vos com a vida e obra de Luis Almagro: que julguem os leitores e tirem as suas conclusões.

*Jornalista, politólogo e analista internacional cubano



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