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TURQUIA EM CLIMA DE GUERRA COM A SÍRIA E A RÚSSIA

Erdogan continua a ser ponta de lança da estratégia da NATO contra a Síria

2020-02-06

Edward Barnes, Damasco; Exclusivo O Lado Oculto

Os mais recentes avanços das tropas regulares sírias na libertação da região de Idleb deram origem a uma multiplicação de acções militares e diplomáticas da Turquia, com apoio dos Estados Unidos, revelando que a NATO continua a alimentar a desestabilização na Síria. O presidente turco deu agora um prazo até 28 de Fevereiro para as tropas sírias abandonarem as localidades libertadas ultimamente na província de Idleb e estende as ameaças à Rússia. O clima é de guerra.

“Qualquer ataque terrestre ou aéreo contra as nossas tropas ou elementos amigos terá uma resposta sem advertência prévia seja qual for a origem”, afirmou o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, numa das várias declarações do mesmo tipo proferidas desde o início do mês. Os “elementos amigos” de que fala o chefe do regime fundamentalista islâmico de Ancara são os terroristas turcomanos do “Exército Nacional Sírio” e também os do Tahrir al-Cham, uma aliança de grupos ligados à al-Qaida.

Durante um discurso aos parlamentares do seu partido AKP, proferido em 5 de Fevereiro, Erdogan deu um prazo até final do mês para as tropas sírias se retirarem das localidades libertadas recentemente na região de Idleb, o último bastião dos terroristas da al-Qaida e outros patrocinados pela NATO em território sírio. O presidente turco exige também que o exército regular sírio se retire para os limites da zona de desmilitarização estabelecidos pelo acordo russo-turco de Sochi, de Junho de 2018.

Um analista político sírio de Damasco faz notar que o chefe do regime turco dá mostras de grande desorientação e de um comportamento “de navegação à vista”, sobretudo desde que se envolveu na guerra da Líbia e nos conflitos petrolíferos que proliferam no Mediterrâneo Oriental. “Essas circunstâncias, combinadas com as pressões que tem sofrido dentro da NATO devido aos negócios militares com a Rússia, aos acordos com Putin e à ‘moderação’ manifestada na Síria tornaram Erdogan perfeitamente imprevisível e perigoso”, assinala o analista.

Terrível início de Fevereiro

Na última fase de 2019 e até quase ao final de Janeiro, a Rússia e a Turquia, com anuência do governo de Damasco, registaram avanços na possibilidade de um entendimento em relação ao conflito sírio, com solução do impasse de Idleb. Em 13 de Janeiro realizou-se uma reunião invulgar de representantes dos serviços secretos militares sírios e turcos, com enquadramento russo, para debater os passos no sentido de uma pacificação à luz dos acordos de Adana, de 1998, e de Sochi, de 2018.

O de Adana permite a intervenção de forças turcas numa faixa de 30 quilómetros de profundidade no Norte da Síria para combater os terroristas do PKK/YPG apoiados pela NATO; e o de Sochi estabelece uma zona desmilitarizada em Idleb para evitar os confrontos directos entre tropas de Damasco e Ancara.

Na segunda quinzena de Janeiro, tropas sírias prosseguiram as operações para libertação dos derradeiros bastiões terroristas e conquistaram 15 localidades na província de Idleb.

No dia 1 de Fevereiro, porém, “elementos amigos” da Turquia pertencentes à al-Qaida assassinaram quatro membros da inteligência militar russa (FSB) em Alepo.

Nos dias 2 e 3 travaram-se combates muito violentos na região de Idleb entre tropas turcas e sírias, com baixas relevantes de ambos os lados, principalmente o sírio – que registou 76 mortos. Ancara afirmou que o seu envolvimento nesses combates se deveu à necessidade de proteger os grupos terroristas da região, os “elementos amigos”, à luz do acordo de Adana. Este documento porém, incide apenas sobre uma faixa de 30 quilómetros de profundidade que não abrange a região de Idleb. No dia 3 Erdogan declarou que “tenho a dizer às autoridades russas que o nosso interlocutor aqui não são vocês mas sim o ‘regime’” (sírio); “não se atravessem no nosso caminho”.

Ponta de lança da NATO

No dia 4 as tropas turcas receberam apoio norte-americano nos seus movimentos, o que confirma o interesse da NATO nesta nova fase de desestabilização síria. Entretanto, Erdogan visitou a Ucrânia e as agressões verbais que na ocasião dirigiu à Rússia e às comunidades russófonas do Leste do país foram idênticas às de qualquer dirigente de países da NATO. O presidente turco afirmou que não reconhece a “anexação” da Crimeia pela Rússia, apesar de a cidade de Sochi, na península, já ter sido palco de vários dos seus encontros com o presidente russo, designadamente para assinar o acordo dito precisamente “de Sochi”. 

Neste cenário, foram suspensas as patrulhas militares conjuntas que a Rússia e a Turquia tinham a funcionar na Síria; e o regime turco interrompeu a transferência de terroristas da al-Qaida que organizou com destino à Líbia, através da Tunísia, para apoiar o governo de Tripoli contra o de Benghazi. Só pouco mais de dois mil mercenários chegaram a fazer a viagem, mantendo-se, ao contrário do previsto, cerca de 30 mil ainda em Idleb.

A decisão significa que a Turquia, como ponta de lança da NATO no conflito, vai continuar a alimentar a guerra na Síria através dos terroristas da al-Qaida procurando, numa primeira fase, evitar o regresso definitivo da região à soberania de Damasco.

“É possível perceber nisto tudo as mãos da NATO”, afirma o analista de Damasco. “A dança de posições de Erdogan combina a restauração da guerra contra a Síria com o envenenamento das relações entre Ancara e Moscovo, um cenário muito desejado pela Aliança Atlântica”.

Ainda em 22 de Outubro passado, precisamente em Sochi, os presidentes Putin e Erdogan assinaram um memorando de entendimento russo-turco cujo elemento essencial é o compromisso de Ancara e Moscovo para actuarem de maneira a “preservar a unidade política e a integridade territorial da Síria”, “combaterem todas as formas de terrorismo e contrariarem projectos separatistas”. A reviravolta na situação é significativa.

Em Moscovo, num encontro com embaixadores, o presidente Vladimir Putin declarou que “infelizmente a humanidade encontra-se novamente próxima de uma linha perigosa. Multiplicam-se os conflitos regionais, a ameaça terrorista e extremista agrava-se, o sistema de controlo de armamento está prestes a ser abolido”.


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