“NÃO FOI JUSTIÇA, FOI VINGANÇA E CASTIGO”

2019-10-15
Publicamos uma carta aberta divulgada pelos nove dirigentes e presos políticos catalães condenados a um total de 100 anos de cadeia por pretenderem auscultar a opinião do povo da Catalunha sobre a independência do país. Através da sentença agora anunciada, escrevem, “pretende-se ignorar os milhões de pessoas que durante os últimos anos defenderam pacificamente o direito à autodeterminação e se mobilizaram a favor da independência”. Os presos políticos catalães reafirmam o apelo ao diálogo, o respeito absoluto pela democracia e a não-violência
Dolors Bassa, Jordi Cuixart, Carme Forcadell, Joaquim Forn, Oriol Junqueras, Raúl Romeva, Josep Rull, Jordi Sànchez, Jordi Turull
Publico.es/O Lado Oculto
Não se fez justiça. A sentença é o triste culminar de uma instrução que não respeitou as garantias processuais próprias do Estado democrático e de direito. Um processo judicial que não procurou fazer justiça. O Estado procurou vingança e castigo.
O uso e abuso da prisão preventiva, os textos acusatórios da Procuradoria, as informações criadas pela Guarda Civil e as declarações dos dirigentes políticos espanhóis antecipando as decisões dos tribunais quando ainda estavam em fase de processo são provas que demonstram os vícios processuais desta causa contra o independentismo. Através dela pretende-se ignorar os milhões de pessoas que durante os últimos anos defenderam pacificamente o direito à autodeterminação e se mobilizaram a favor da independência.
O estabelecimento do processo por rebelião demonstrou que era premeditado e com o único propósito de segregar a vontade dos cidadãos expressa nas urnas. Amordaçou-se a vontade de milhões de catalães e catalãs através da suspensão dos seus representantes escolhidos nas urnas, o que é de uma gravidade sem matizes em termos democráticos.
Estamos orgulhosos de ter impulsionado e organizado o referendo de autodeterminação. E convidamos toda a cidadania da Catalunha a sentir-se orgulhosa do seu comportamento em 1 de Outubro de 2017 e da dignidade mostrada nesse dia e nos seguintes.
Mantemos intacta a convicção de que a decisão sobre o nosso futuro colectivo pertence aos cidadãos deste país. A nossa vontade de impulsionar uma Catalunha livre e justa é inseparável da nossa convicção democrática e pacífica. Por isso, das prisões de Lledoners, Puig de les Basses e Mas d’Enric renovamos publicamente o nosso compromisso com a democracia para continuar a defender, com plena convicção e determinação, o futuro do nosso país. A nossa aposta passa pela transformação da Catalunha num Estado independente em forma de República. Mas porque os independentistas são democratas, jamais renunciaremos a que sejam as mulheres e os homens da Catalunha a expressar-se livremente nas urnas para decidir o futuro político do país.
O contencioso político que vivemos não é novo, vem de longe e estamos conscientes de que somos uma etapa mais no longo caminho em direcção à liberdade do nosso país. Queremos prestar homenagem a tantos homens e mulheres que, em condições muito piores que as nossas, deram o melhor de si para defender a mesma causa que hoje representamos, uma causa que não é outra senão a liberdade da Catalunha. Recordamos e homenageamos especialmente o presidente Lluís Companys, julgado e condenado por rebelião, no ano de 1934, pelo Tribunal Supremo equivalente da época e assassinado em 15 de Outubro de 1940, completam-se hoje 79 anos, por decisão de um outro tribunal espanhol.
A sentença que nos condena injustamente a 100 anos de prisão por defender pacificamente o direito à autodeterminação não é um obstáculo, antes pelo contrário, a uma nova manifestação do nosso compromisso com o diálogo e a renovar uma vez mais a nossa aposta na busca de uma solução para o conflito através das vias democráticas.
Encorajamos os cidadãos a perseverarem na dignidade mostrada durante os últimos anos, a não perderem a capacidade de se indignar e rebelar-se contra decisões injustas e, sobretudo, a manter a esperança na conquista de um futuro de justiça e liberdade através do exercício efectivo do direito à autodeterminação.
Apelamos a que saiam às ruas e façam ouvir a nossa voz em todos os lugares, de maneira firme e com toda a coragem que temos para nos manifestarmos com uma adesão indispensável e incondicional aos princípios e à prática da não-violência. Evitemos as provocações e desautorizemos, na prática, os que pretendem confundir-nos e envolver-nos em actos de violência que não avalizamos nem avalizaremos.
Com a força que nos é dada pelo apoio recebido de tantas pessoas, com a nossa gratidão a todos os que desejam um futuro mais próspero e uma sociedade mais justa e livre, e com uma lembrança especial às nossas famílias, a todos os nossos amigos e amigas por tanta consideração e cumplicidade, daqui vos afirmamos que seremos livres!