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O PPE DE NAMORO COM O NEOFASCISMO

Se Orban está no PPE por que não há-de entrar o fascista Kaczynski?

2018-09-28

Pilar Camacho, Bruxelas

A CDU/CSU alemã, em conjugação com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, continuam a multiplicar esforços para que o Partido Direito e Justiça (PiS), organização de extrema-direita que governa a Polónia, seja integrado no Partido Popular Europeu (PPE), o maior grupo do Parlamento Europeu e que continua a considerar-se “democrata-cristão e federalista”. Se tal acontecer, o PiS neofascista e anti-União Europeia de Kaczynski irá juntar-se ao também neofascista Fidesz húngaro de Viktor Orban, ao PSD e ao CDS.
Partindo do princípio tecnocrático de que a aritmética do poder justifica a fraternidade com organizações que se abeiram do fascismo e pertencem ao grupo dos chamados “iliberais”, a direita governamental alemã procura prevenir-se contra uma eventual erosão nas eleições europeias do próximo ano que lhe poderia enfraquecer os instrumentos de controlo sobre as instâncias da União. Nesta acção de intriga política destaca-se o actual presidente do PPE, Manfred Weber, vice-presidente da direita bávara CSU, empenhado em tornar a sua candidatura à presidência da Comissão Europeia à prova de bala.
Um elemento fulcral da operação é o próprio presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, ou melhor, o seu secretário-geral e verdadeiro homem forte da Comissão, o alemão Martin Selmayr, da CDU de Merkel. Os dois estão a desenvolver diligências para que sejam suspensos os procedimentos que poderiam conduzir a Polónia a ser sancionada internamente na União Europeia por violar o Estado de direito.
Esta suspensão de procedimentos seria importante, mas não essencial, atendendo à “jurisprudência” do comportamento da União Europeia perante as organizações populistas e neofascistas. Só ao fim de muitos anos estão agora em desenvolvimento procedimentos contra a Hungria de Orban; e tal circunstância não alterou, até ao momento, o estatuto do Fidesz, partido governante em Budapeste, dentro do PPE.
O comportamento do PiS no governo da Polónia caracteriza-se por um conjunto de atitudes e medidas próprias de uma organização neofascista: censura, restrições da liberdade de expressão e opinião, vigilância abusiva dos cidadãos, perseguições políticas no acesso a cargos públicos, xenofobia, intolerância religiosa.
Até à legislatura actual, o partido polaco tem integrado o Grupo dos Conservadores e Reformadores Europeus (ECR) no Parlamento, agora ameaçado de implosão devido ao Brexit e ao êxodo forçado dos deputados conservadores britânicos, que o sustentam. Ao PiS não interessaria figurar num grupo com pouca expressão, que lhe diminuiria a influência não apenas no Parlamento mas também nas outras instâncias da União.

Uma mão lava a outra

De modo que as diligências alemãs para manter um PPE forte como primeiro grupo parlamentar e extremamente influente nos órgãos da União vem ao encontro das dificuldades do PiS, instável e de futuro duvidoso no grupo em que se encontra.
Cálculos por alto, tendo em conta a situação actual, fazem prever que o PPE possa perder em torno de 40 dos seus 219 deputados nas eleições do próximo ano, reflectindo as crises do Partido Popular espanhol, do Forza Italia de Berlusconi e mesmo da Plataforma Cívica Polaca, o partido rival do PiS e chefiado por Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu. Sem esquecer a reviravolta política em França com o aparecimento do partido de Macron – En Marche.
As diligências desenvolvidas no interior do PPE para a admissão do PiS têm estado a cargo sobretudo de Martin Selmayr e vão deparando com alguma oposição de eurodeputados holandeses e franceses, principalmente.
Selmayr tem argumentado que o PiS está em mudança num sentido mais moderado, uma vez que o estado de saúde fragilizado do verdadeiro chefe e condutor do partido, Jaroslaw Kaczynski, não lhe permite acompanhar os acontecimentos tão de perto. Isto tornaria o ambiente entre os dirigentes mais maleável perante circunstâncias oportunas que têm como finalidade manter a influência no plano europeu fazendo parte do partido dominante. A direita governamental alemã estaria assim a prometer uma adesão do PiS expurgado, a prazo, de Kaczynski.
Entre as várias circunstâncias que trazem o PPE inquieto e, por extensão, a direita alemã, está a imprevisibilidade resultante das transformações em França.
O En Marche de Macron poderá vir a formar um grupo importante no próximo Parlamento, com alinhamentos ainda duvidosos mas que, entre os cenários possíveis, poderia vir a aliar-se aos sociais-democratas, verdes e mesmo aos liberais nas situações em que estejam em jogo a presidência da Comissão e outros cargos estratégicos. Nesses casos, a maioria do PPE poderia não ser suficiente e, neofascistas ou não, os votos do PiS e do Fidesz contam tanto como os outros – tratando-se de uma questão fulcral: governar a União Europeia.

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