O LADO OCULTO - Jornal Digital de Informação Internacional | Director: José Goulão

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ALGO ESTÁ A MEXER NA COREIA DO SUL

Lee Sang-hoon, presidente da Sansung e continuador das tradições do grupo de perseguição aos sindicatos. A acção da justiça sul-coreana é uma surpresa

2018-10-05

Alexander Park, Seul

A Justiça da Coreia do Sul abriu um processo de acusação contra o poderoso presidente do grupo Samsung Electronics, Lee Sang-hoon, por práticas contra a sindicalização de trabalhadores que duram há anos. A iniciativa é considerada surpreendente, porque contraria a política tradicional do regime de Seul de apoio às perseguições sindicais. Na Coreia do Sul, apenas 300 dos 200 mil trabalhadores do grupo Samsung são sindicalizados.

Nos termos da acusação, Lee Sang-hoon e as suas administrações recorreram a um conjunto de práticas intimidatórias para impedir a criação de sindicatos nas empresas do grupo, designadamente ameaças de despedimentos, redução de salários, ruptura arbitrária de contratos com fornecedores que manifestassem simpatia com os trabalhadores e com as organizações sindicais.
A Promotoria de Justiça considera que as práticas em vigor no grupo transnacional correspondem a “crime organizado”. O processo envolve ainda funcionários do Ministério do Trabalho e da polícia. A investigação prolongou-se durante cinco meses e foi desenvolvida na sequência da descoberta de documentos comuns a outro processo que envolve o ex-presidente Lee Myung-bak.
A Samsung foi criada em 1938 e nunca tolerou a existência de sindicatos na empresa. Segundo a política oficial, os sindicatos são criadores “de conflitos inúteis” e, por isso banidos. Ao longo da história da Samsung têm sido detectados casos graves de intimidação contra trabalhadores, designadamente através do uso de violência física e até de sequestros. Apenas em 9 das 60 empresas do grupo Samsung na Coreia do Sul existem sindicatos.

Consequências dramáticas

Existem ainda outras consequências dramáticas destas práticas toleradas até agora pelos poderes públicos.
A utilização de produtos nocivos no interior das empresas do grupo, sem protecção nem advertências dos sectores patronais, nem defesa conduzida pelos sindicatos, tem provocado a multiplicação de casos de doenças como leucemia e cancros.
As vítimas e as suas famílias têm procurado obter reparações na Justiça, mas nem sempre são bem sucedidas; ou, quando isso acontece, só ao cabo de lutas que se prolongam por mais de uma dezenas de anos.
Apesar das restrições à sua actividade, os sindicatos na Coreia do Sul têm uma história de luta pelos direitos laborais, cívicos e humanos, muitas vezes na clandestinidade, como aconteceu sobretudo durante os períodos de ditadura militar, nos anos setenta e oitenta do século passado.
A substituição dos regimes militares por democracias civis formais como suporte da instauração plena do sistema económico neoliberal manteve a marginalização dos sindicatos – já não tanto em termos legislativos, porém desrespeitados pela maioria das empresas, sobretudo as mais influentes, entre elas a Samsung.
O grupo Hyundai surge como uma excepção no ambiente dominante, com uma percentagem de sindicalização de 74%. Porém, a taxa de sindicalização em todo o país não ultrapassa os 10%.
A intervenção da Justiça no caso da Samsung corta com a impunidade das práticas anti-sindicais enraizadas, numa altura em que o governo do presidente Moon Jae-in também parece seguir contra a corrente política habitual ao procurar uma cooperação mais consistente com a Coreia do Norte – e que vem gerando ampla mobilização popular de apoio.

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