WASHINGTON ESCAPA À JUSTIÇA INTERNACIONAL

2019-04-16
Mirko C. Trudeau, America Latina en Movimiento/O Lado Oculto
Pressionados por Washington, os juízes do Tribunal Penal Internacional (TPI) rejeitaram uma petição para abrir uma investigação por crimes contra a humanidade e crimes de guerra cometidos por forças militares e mercenários dos Estados Unidos no Afeganistão. A parte norte-americana qualifica este facto como “uma grande vitória”.
O anúncio da decisão é um duro revés para a Procuradoria e foi rapidamente condenado por grupos de defesa dos direitos humanos, para os quais se trata de “um golpe devastador” para as vítimas da invasão do Afeganistão, iniciada em 2001.
“Os juízes decidiram que uma investigação sobre a situação no Afeganistão neste momento não serviria os interesses da justiça”, afirma um comunicado do tribunal com sede em Haia, apesar de admitir a existência de “uma base razoável que permite considerar que possam ter sido cometidos crimes no Afeganistão que são da competência do TPI”.
Contudo, rejeitaram que a investigação e o processo judicial pudessem efectuar-se com êxito na situação actual e devido “à previsível ausência de recursos adicionais para o orçamento do tribunal”. Por isso, lê-se no comunicado, “é pouco provável que a continuação de uma investigação conduza à concretização dos objectivos enumerados pelas vítimas favoráveis à investigação”.
Ameaças e sanções
A rejeição deste processo por parte dos Estados Unidos tornou-se evidente desde que a Procuradoria solicitou a abertura da investigação sobre o Afeganistão, em Novembro de 2017. O assessor de segurança nacional, John Bolton, ameaçou em Setembro último impor sanções económicas contra os membros do tribunal. Além disso, anunciou há um mês que proibiria a entrada nos Estados Unidos dos juristas do TPI e cumpriu a palavra há uma semana, quando retirou o visto à procuradora geral, Fatou Bensouda.
Foi, portanto, através de pressões e sanções que os Estados Unidos conseguiram impedir qualquer investigação do TPI relacionada com as múltiplas violações dos direitos humanos cometidas pelas tropas norte-americanas colocadas no Afeganistão ou noutros países, e também pelo regime israelita, aliado de Washington.
Michael Pompeo, secretário de Estado norte-americano, revelou que a Administração Trump também tenciona impor embargos económicos ao Tribunal Penal Internacional se “não mudar de atitude”. Os Estados Unidos não ratificaram o Estatuto de Roma que criou o TPI, em 2002, cujo objectivo é levar perante a justiça os responsáveis por crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídios. Obviamente, não ratificaram porque um tal tribunal poderia investigar os genocídios que tem praticado no Afeganistão, no Iraque e em outros países.
Várias organizações humanitárias criticaram o TPI por rejeitar a investigação de actos cometidos por tropas norte-americanas, talibãs e autoridades do Afeganistão, actos esses que podem configurar crimes de guerra e crimes contra a humanidade. “Os juízes permitiram que as considerações políticas se sobreponham aos direitos das vítimas”, afirmou Param-Preet Singh, directora associada da organização Human Rights Watch, que qualificou a decisão como “um golpe devastador para as vítimas”.
“A decisão será encarada como uma capitulação perante a intimidação e as ameaças de Washington”, afirmou em comunicado o director da região da Ásia Meridional da Amnistia Internacional, Biraj Patnaik, que qualificou a rejeição como “surpreendente”, pois “debilitará a já questionada credibilidade do tribunal”.
A seguir ao anúncio da decisão, o presidente norte-americano, Donald Trump, saudou-a como “uma grande vitória” do “Estado de direito”. O seu secretário de Estado, Michael Pompeo, declarou: “Estou satisfeito porque o tribunal reconsiderou os seus actos”.
A procuradora-geral do TPI, Fatou Bensouda, anunciara em Novembro de 2017 que iria pedir aos juízes autorização para abrir uma investigação sobre crimes de guerra e contra a humanidade cometidos no quadro do conflito afegão, em especial pelo exército norte-americano. A Procuradora iniciara um exame preliminar da situação em 2016. Bensouda não excluiu agora a possibilidade de apresentar recurso perante o TPI.